domingo, 22 de junho de 2008

Um cara triste ejacula a solidão na fila pra pagar

Agora eu sou um pilantra por acordar às quatro da tarde e com sono num domingo de inverno. Por eu achar o máximo acordar com a casa vazia. Por colocar um Elvis na vitrola e abrir uma cerveja importada que eu prevenidamente comprei com a grana que sobrou da garrafa de uísque. Por beber deliberadamente. Agora eu sou um pilantra por achar tudo isso o máximo.
Que eu sou um cara simpático. Gentil, as vezes. Mas eu não posso permanecer inalterado. Essa coisa de irrelevância, sabe? Claro que sabe. Você quer casar, quer casa própria, três filhos no máximo, um consórcio de carro zero. “Pro futuro, né? Pro Júnior entrar na faculdade. Vai ser doutor, doutor. Diz ‘oi’ pro tio, Junior.”
Acho que estou ficando morto aos poucos. Eu to me sentindo assim. Eu olho para os lados e não consigo me enquadrar em nenhum estereotipo de pessoas. As pessoas têm me olhado torto, elas viram a cara. As mulheres fogem de mim. Elas não querem ouvir minha conversa. Nem o barman me agüenta mais e eu continuo achando que sou melhor do que os outros pensam. As pessoas me evitam. Talvez por vingança. Talvez por eu sempre ter evitado elas, agora estou levando o troco.
Eu me sinto deslocado. Porque apesar de ninguém gostar de mim, eu gosto. Eu gosto do meu jeito. Das minhas manias. Do jazz e do uísque. Das unhas roídas, dessa barriga acumulada ao longo dos anos. Eu gosto de saber quem é Buckowski, de ter livros, de ler. Eu gosto de gostar de ser assim. De não me importar com o que os outros pensam. E não dá pra levar a sério uma banda que toca pagode, axé, sertanejo e reggae. Não dá pra levar a sério quem acha isso o máximo.
Que eu não sou de sair por aí contabilizando beijos para fechar o balanço. Mas pergunto “dá o cu?”, embora eu saiba que cu não se pede, se come. Que eu prefiro as miras técnicas aos programas de domingo. Que eu não coloco gelo no uísque. Que eu vou com sede ao pote. Que eu prefiro um blues ao hino da bandeira. Que tudo o que eu vivo, vivo pra contar. Só que tá sendo difícil achar os adjetivos certos.
Eu vou fazer o quê se não tem mais ninguém por perto que goste do que eu gosto? Se todo mundo me critica por não fazer a barba? Se eles querem que eu emagreça? Ta todo mundo mudando de assunto. E nessa, ninguém sabe o que falar. Mas o errado sou eu?
Um cara espera anos para ser contemplado num consórcio. ‘Pagar devagarinho’. E eu sou o maluco. O caixa do banco vai passar a vida inteira contando dinheiro dos outros. Eu sou o doido, e a vendedora vai mostrando a liquidação de verão, a coleção de inverno, aquela blusa da vitrine, tem maior?, e de outra cor?.
Deixa eu ver no estoque.
“Que o cliente tem razão. Que ‘tenque’ aumentar as vendas. A meta, sabe? E tem a comissão também. É boa. Dá pra pagar o mercado e sobra pro salão. ‘Tenque’ ficar bonita pro marido, né.”
É, é...‘tenque’.

4 comentários:

Anônimo disse...

Ia postar aqui. mas o farei amanha, contando que o post eh novo em folha (amanha ou terça, dependno de como for meu dia, e da isnpiração - afinal, quase me demiti do blog, preciso ficar a altura)

Jaguardiões disse...

Eu não estou indo a lugar nenhum. Apenas sigo em frente.

Jaguardiões disse...

Aliás, seu texto foi tão bom, que me inspirou a dar uma rapidinha ali em cima.

Anônimo disse...

ai seu gordinho barbudo, você tá virando um maldito moderninho.